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O agro e a nova contabilidade climática do Brasil: desmatamento na balança

Por que parte do desmatamento vai passar a entrar na conta da agropecuária nos planos de descarbonização do país e o que isso muda?


O Brasil deu um passo decisivo na implementação do seu plano climático. No dia 18 de julho de 2025, o governo federal apresentou sete planos setoriais de descarbonização, que integram a Estratégia Nacional de Mitigação, parte do Plano Clima. 


Um ponto de destaque foi que, pela primeira vez, ficou definido que as emissões decorrentes de desmatamento em propriedades rurais privadas deixarão de ser contabilizadas no setor “Mudança de Uso da Terra e Florestas” do Inventário Nacional de Gases de Efeito Estufa (GEE) e passarão a ser registradas diretamente no setor Agropecuária. Essa mudança não se aplica aos demais setores que também respondem por emissões decorrentes de desmatamento como a expansão urbana e industrial (obras de infraestrutura, loteamentos e ocupações), a mineração e extração mineral (lavra a céu aberto e atividades associadas) e a silvicultura (substituição de vegetação nativa por florestas plantadas).


A mudança é metodológica e estratégica: as emissões associadas à conversão de vegetação nativa para uso agropecuário serão incorporadas à conta do setor, criando um vínculo direto entre a responsabilidade setorial e os resultados das ações de mitigação. Antes, todo o desmatamento era agrupado em uma categoria única, conforme a classificação do IPCC, sem distinção por atividade.


Agora, o governo brasileiro adota uma organização interna que distribui essas emissões de acordo com as responsabilidades práticas e os instrumentos de controle disponíveis para cada setor. O resultado: a agropecuária passa a responder diretamente pela maior parte das emissões ligadas ao desmatamento em áreas privadas, mas também poderá abater da conta ganhos obtidos pela recuperação de áreas degradadas e adoção de outras práticas regenerativas.


O tamanho da responsabilidade


Segundo os dados do Inventário Nacional de GEE, as emissões brutas por mudança de uso da terra somaram 1,393 bilhão de toneladas de CO₂ em 2022. Deste total, cerca de 70% estão ligadas a áreas de produção agrícola e pecuária, ou seja, são emissões que passam a compor o “orçamento de carbono” do setor agropecuário nos planos nacionais.


As metas para o setor são ambiciosas:

  • Reduzir a emissão total para 891 milhões de toneladas de CO₂ até 2030

  • Atingir 640 a 700 milhões de toneladas até 2035


A redução depende principalmente de uma estratégia-chave: diminuir drasticamente o desmatamento vinculado à produção agropecuária.


O que entra no plano da agricultura e pecuária?


O plano setorial do agro está estruturado em 10 alavancas prioritárias, divididas entre ações impactantes (diretas) e estruturantes (viabilizadoras):


Ações impactantes (mitigação direta):

  1. Recuperação de áreas degradadas

  2. Sistemas integrados (lavoura-pecuária-floresta)

  3. Produção florestal sustentável

  4. Aumento da produtividade

  5. Expansão sustentável da irrigação

  6. Redução de perdas e aproveitamento de resíduos

  7. Ampliação de práticas agroecológicas

  8. Produção de biocombustíveis

  9. Redução do desmatamento legal e combate a incêndios

  10. Aquicultura de baixo carbono


Ações estruturantes:

  • Reformulação do crédito rural com critérios climáticos

  • Regulação de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA)

  • Apoio à bioeconomia e digitalização

  • Governança, assistência técnica e capacitação


A execução será coordenada por quatro ministérios: Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Desenvolvimento Agrário (MDA), Pesca (MPA) e Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA).


Por que essa decisão importa?


A alocação das emissões associadas ao desmatamento na conta da agropecuária reconfigura o papel do setor nos compromissos climáticos do Brasil, especialmente às vésperas da COP30, que será realizada em Belém em novembro deste ano.


Essa mudança reforça a responsabilidade do setor produtivo sobre práticas como uso do solo e recuperação de áreas degradadas, redução do desmatamento, ao mesmo tempo em que coloca o Brasil em linha com expectativas internacionais de rastreabilidade e compromisso climático e impulsiona debates sobre financiamento climático e PSA (Pagamento por Serviços Ambientais).


Essa decisão também gerou tensões. Representantes do setor estão analisando os planos e indicam que a integração de metas setoriais com políticas de crédito, inovação e extensão rural será decisiva para que a transição ocorra de forma justa e viável. 


Os planos setoriais estarão em consulta pública de 28 de julho a 18 de agosto de 2025. Após esse período, as contribuições serão avaliadas e o conteúdo final submetido à aprovação de um conselho interministerial, composto por todos os ministérios envolvidos. Após a aprovação, os planos serão oficialmente publicados e entrarão em fase de implementação e monitoramento, orientando as ações setoriais de descarbonização no país.


Conclusão


Com a inclusão das emissões associadas à mudança de uso da terra na conta da agropecuária, o Brasil envia um sinal importante à comunidade internacional: a descarbonização será construída sobre bases mais transparentes e setorialmente ancoradas.


Para o setor, isso representa uma grande responsabilidade frente ao compromisso climático do Brasil, mas vem também com a oportunidade de liderar a regeneração, com dados, soluções tecnológicas e modelos de produção mais inteligentes e integrados.


Nota de fonte


Este artigo foi elaborado com base no conteúdo original publicado pelo portal Reset, na matéria:  “Em planos de descarbonização, parte do desmatamento entra na conta do agro”, disponível em: https://capitalreset.uol.com.br/clima/cop/em-planos-de-descarbonizacao-parte-do-desmatamento-entra-na-conta-do-agro.Todos os dados, termos e estrutura de planos aqui apresentados refletem as informações divulgadas na reportagem de 22 de julho de 2025.


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