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GLEN A. BRODERICK

Roleta premiada

Atualizado: 20 de set.



A roleta do futuro gira e reserva o prêmio da sustentabilidade da atividade leiteira para aqueles que mirarem nas valiosas estratégias de controle dos impactos ambientais.


Acredita-se que a demanda por produtos lácteos continuará a crescer juntamente com a população global. Chase (2021) resumiu as razões pelas quais a produção de leite continuará sendo importante para a nutrição humana nos próximos anos, incluindo o fato que os lácteos são as principais fontes de nutrientes, como vitaminas, cálcio, fósforo e, especialmente, proteínas de alta qualidade.


Os bovinos de leite são mais eficientes que os não ruminantes para converter proteína vegetal em animal, ou proteína não consumível em consumível, com média de produção de “Proteína Comestível para Humanos” (PCH) igual a 2,1, nos Estados Unidos (EUA; CAST, 1999). A contribuição da PCH de ruminantes foi discutida em artigos recentes (Ertl et al., 2016; Broderick, 2018). Os bovinos leiteiros contribuem para a sustentabilidade ambiental ao reciclar muitos dos subprodutos da indústria de processamento de alimentos, como os grãos de destilaria, gerados a partir da produção de etanol na América do Norte e Europa (Chase, 2021). Tricarico (2016) especulou que alimentos com mais de 30% de fibra (fibra em detergente neutro, FDN) eram inutilizáveis por humanos e não ruminantes e relatou que a dieta comumente fornecida a vacas em lactação nos EUA contém, aproximadamente, 33 ingredientes diferentes. Van Amburgh et al. (2019) estimaram que os subprodutos representam, em média, cerca de 30% do consumo de matéria seca (CMS) dos bovinos leiteiros nos EUA. No entanto, além de ser ambientalmente e economicamente sustentável, a produção leiteira precisa ser aceita socialmente pelos consumidores. Capper (2020) afirmou que os consumidores continuam muito preocupados com o impacto ambiental e os efeitos do aquecimento global gerados pela produção de lácteos, fatos que podem influenciar o consumo desses produtos.


A atividade humana resultou na produção de gases do efeito estufa (GEE), principalmente o dióxido de carbono, que se acumulou exponencialmente na atmosfera desde o início do século 19, levando ao aquecimento global (U.S. Global Change Program). A agricultura contribui com cerca de 11% do Potencial de Aquecimento Global Atmosférico equivalente (PAGe). Cerca de 20% do PAGe é atribuído ao metano produzido por ruminantes domésticos e cerca de 10% aos GEE provenientes dos dejetos (IPCC, 2014). Aqui, enfatizaremos a produção de metano a partir da fermentação microbiana que ocorre no rúmen. Microrganismos metanogênicos anaeróbios residem principalmente em protozoários ciliados do rúmen e usam o “excesso” de energia na forma de hidrogênio para reduzir o dióxido de carbono a metano (Wattiaux et al., 2019). As fermentações ruminais que favorecem a formação dos ácidos graxos voláteis (AGV) acetato e butirato geram maiores quantidades de metano, enquanto as fermentações que formam mais propionato produzem menores concentrações do gás (Ungerfeld, 2020). Além disso, a formação de metano representa grande perda de energia para o animal (Wattiaux et al., 2019)


Qualquer estratégia nutricional ou de manejo que aumente a produção de leite por vaca ou a eficiência alimentar, reduzirá o metano ruminal e o PAGe da produção leiteira (Chase, 2021). Em todo o mundo, a produção por vaca tem aumentado. Por exemplo, nos EUA, aumentou 12,2% nos últimos quatro anos (Tabela 1; Foreign Agricultural Service/USDA Global Market Analysis). Isso permitiu aumento substancial na produção de lácteos, praticamente sem alteração no número de vacas. Embora crescente, a produção por vaca evoluiu apenas 4,8% no Brasil, no mesmo período. Os números da lactação fechada também diferem: nos EUA, é cerca de 11.000 kg/ano, enquanto, no Brasil, a média é de apenas 1.500 kg/ano (Tabela 1).



ALÉM DE ECONOMICAMENTE SUSTENTÁVEL, A PRODUÇÃO LEITEIRA PRECISA SER SOCIALMENTE ACEITA PELOS CONSUMIDORES


No entanto, os rendimentos por vaca em diferentes regiões do Brasil variam de 630 a mais de 4.000 kg leite/ano (U.S. Global Change Program). Assim, reconhecemos que há espaço para melhorar a sustentabilidade econômica e ambiental no setor leiteiro brasileiro. A nutrição e o manejo aprimorados reduziram em 46% a intensidade de metano emitido (metano/kg de leite) pela produção de leite na Califórnia (estado dos EUA que ocupa o primeiro lugar no ranking de produção), de 1964 a 2014 (Naranjo et al., 2016). Os mesmos autores relataram que as vacas em lactação foram responsáveis por 67% da pegada de GEE da pecuária leiteira, e cerca de 5% e 27% foram provenientes, respectivamente, da manutenção das vacas secas e da criação de novilhas. No entanto, na sequência, enfatizaremos as estratégias para reduzir a intensidade de metano somente pelas vacas em lactação.


Alimentação de precisão


Desde a publicação do modelo do Potencial de Fermentação da Uréia, de Burroughs et al. (1975), sistemas de alimentação cada vez mais precisos surgem para balancear dietas para vacas em lactação. Por meio deles, as exigências nutricionais podem ser atendidas com mais precisão e, à medida que a produção por vaca aumenta, a produção de metano é diluída pelo maior volume de leite produzido.


Os modelos incluem o Cornell Net Carbohydrate and Protein System (Van Amburgh et al., 2019), também disponível nas versões NDS Dynamics e AMTS (marcelohentzramos@gmail.com); o Nordic Feed Evaluation System (Volden et al., 2011), amplamente aplicado no norte da Europa; o Sistema de Alimentação para Ruminantes francês, INRA (Wageningen, 2018), e a recém lançada 8ª edição do Nutrient Requirements of Dairy Cattle (NASEM, 2021). Além desses, encontra-se disponível um sistema atualizado para alimentação de gado de corte brasileiro, o BR-Corte (2016). No entanto, o sistema nacional para bovinos leiteiros ainda não foi publicado.


Garg et al. (2016) aplicaram um modelo de exigências nutricionais disponível no National Dairy Development Board of India, para balancear dietas de, aproximadamente, 164.000 vacas leiteiras de pequenas fazendas distribuídas em quatro estados da Índia. Os autores observaram reduções dramáticas na intensidade de metano emitido. Embora as emissões totais de GEE tenham aumentado de 24,4 para 26,5 toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2 eq.), após o balanceamento das dietas, a produção de leite aumentou e a intensidade de metano caiu. White e Capper (2014) descobriram que a reformulação semanal da dieta, levando em consideração a mudança na composição dos ingredientes do concentrado, foi muito mais eficaz do que a reformulação a cada três meses ou mesmo a cada mês.


Numerosos ensaios foram conduzidos para estudar os efeitos na produção de leite ao alterar o fornecimento de proteínas ou aminoácidos. Olmos e Broderick (2006) adicionaram farelo de soja (FS) para aumentar a proteína bruta (PB) da dieta, de 13,5% para 19,4%. A produção respondeu com aumentos máximos de 16,7% de rendimentos de leite e 17,1% de proteína verdadeira do leite. Assim, utilizando a equação de Congio et al. (2022), as estimativas de emissões de metano a partir do CMS indicaram que a intensidade de metano produzido foi menor em 10,6 g metano/kg de leite corrigido para energia (LCE), com o consumo de 15,0% de PB. A proteína no FS, um dos principais suplementos proteicos fornecidos aos ruminantes, possui a metionina como primeiro aminoácido limitante (NASEM, 2021). Nursoy et al. (2018) forneceram dietas à base de FS contendo 11, 13, 15 e 17% de PB, com metionina protegida para manter a relação metionina:lisina de 3:1, na proteína metabolizável das quatro dietas. De acordo com os resultados, as produções de leite e proteína verdadeira do leite aumentaram a cada incremento de PB e as emissões de metano estimadas a partir do CMS foram declinadas (Figura 1).



Meta-análises dos efeitos da substituição de FS por farelo de canola (Huhtanen et al., 2011; Martineau et al., 2013) indicaram aumento em produção de leite e proteína do leite, quando o alimento proteico foi substituído. Ainda, Holtshausen et al. (2021) mostraram que a substituição de FS por farelo de canola foi eficaz para reduzir a intensidade do metano produzido. Além disso, a suplementação com aminoácidos essenciais, identificados como limitantes no alimento, tem potencial para melhorar a eficiência alimentar – metionina protegida (Zanton et al., 2014; Patton, 2010) e lisina e histidina protegidas (Lee et al., 2013; Giallongo et al., 2017)


Alta energia


Como todos os ruminantes, os bovinos leiteiros requerem quantidades adequadas de FDN na dieta para manter a função ruminal. Wales et al. (2009) alimentaram vacas em lactação em pastagem de azevém, suplementadas com 3 kg/d ou 6 kg/d de concentrando contendo, principalmente, cevada moída e flocos de milho a vapor. Os autores observaram aumento de cerca de 2 kg/d de leite e redução da intensidade de metano, como resposta aos 3 kg/d de suplemento fornecido. Mas, diante dos 6 kg/d de suplemento, houve nenhuma resposta em produção de leite, além de redução muito menos acentuada na intensidade de metano, o que os autores justificaram como possível limitação genética dos animais. Assim, os resultados sugeriram que o fornecimento de mais energia fermentável a partir de amido, e menos oriunda da FDN, reduz a produção de metano.


A ensilagem dos grãos de milho com alta umidade é amplamente praticada em fazendas leiteiras da América do Norte e Europa. Ao avaliarmos se a moagem do milho com alta umidade seria vantajosa quando fornecida na dieta total para vacas em lactação (Ekinci e Broderick, 1997), observamos que a redução do tamanho médio das partículas, de 4,3 para 1,7 mm, aumentou a produção de leite e proteína do leite em, respectivamente, 2,4 e 0,12 kg/d e reduziu a intensidade de metano em 12% por unidade de leite e 10% por unidade de proteína. A redução das concentrações de amônia no rúmen indicou que a formação de proteína microbiana foi elevada e a redução da intensidade de metano foi efeito da diluição pela produção de leite. Resultados impressionantes também foram obtidos por Charbonneau et al. (2006), que observaram que a moagem do grão de milho (comparada ao milho quebrado), com ou sem adição de amido, aumentou a produção de leite e proteína do leite e reduziu a intensidade de metano por unidade de leite e proteína do leite.


A silagem de cana-de-açúcar é comumente fornecida para ruminantes no Brasil, devido à ampla disponibilidade. Mas seu valor nutricional é inferior ao da silagem de milho (Mariz et al., 2013). Magalhães et al. (2004) testaram se a silagem de milho poderia ser substituída pela silagem de cana-de-açúcar, como volumoso único na dieta das vacas em lactação (Tabela 2). Apesar da queda significativa no CMS e na produção de leite, a produção de proteína do leite foi numericamente semelhante à resultante da substituição por 33% de silagem de cana-de-açúcar. A emissão de metano diminuiu em função da redução do CMS, mas, notavelmente, a intensidade de metano (por unidade de proteína do leite) foi menor quando a substituição foi de 33% da silagem de milho. Por fim, os autores concluíram que esse nível de substituição foi o mais viável economicamente. A produção de metano por unidade de leite foi semelhante quando houve substituição de 0 a 67% da silagem de milho pela cana-de-açúcar, mas o metano por gordura corrigida no leite não foi melhorado a partir de proporção alguma de substituição (Tabela 2). Esses efeitos são, em grande parte, impulsionados pela redução no CMS, decorrente do aumento do enchimento ruminal pela FDN da silagem de cana, quando comparada à silagem de milho: 52% vs. 28% de FDN indigestível, respectivamente (Oliveira et al., 2011).



As forragens de gramíneas são fornecidas como pastagem ou ensiladas para bovinos leiteiros em todo o mundo. Como são quase desprovidas de amido, a substituição de uma porção por silagem de milho (com 25-35% de amido, base MS) pode ser benéfica em dietas para vacas em lactação. Khan et al. (2015) verificaram que a substituição de 50% da MS da silagem de capim por silagem de milho aumentou o CMS, a produção e a proteína do leite. Já as emissões de metano aumentaram 14%, devido ao maior CMS. Claramente, as mudanças na dieta que provocam aumento da produção de leite (e dos componentes do leite), provavelmente aumentarão o lucro, mas não necessariamente melhorarão a sustentabilidade ambiental do sistema de produção.


Pesquisadores indicaram que aditivos na silagem, particularmente a inoculação com bactérias ácido lácticas antes da ensilagem, melhoraram o consumo e o valor energético da silagem (Muck et al., 2018). Winters et al. (2001) avaliaram novilhos Charolês com cerca de 400 kg, alimentados à vontade com dieta de silagem de azevém não tratada (controle), silagem de azevém tratada com ácido fórmico ou silagem de azevém tratada com bactérias ácido lácticas. Os tratamentos reduziram substancialmente a formação de nitrogênio não-proteico na silagem, o que otimizou a utilização das proteínas. A inclusão de aditivos aumentou o ganho médio diário e ganho/CMS e, embora as emissões de metano tenham aumentado, a intensidade por unidade de ganho médio diário foi substancialmente reduzida.


Aditivos dietéticos


Desde meados da década de 1970, os ionóforos são fornecidos para aumentar a eficiência alimentar dos bovinos de corte. O suposto modo de ação foi inicialmente atribuído à redução da formação de metano, com efeito de aumento da formação de propionato, redução da formação de acetato e butirato e melhor captura de energia da dieta para o desenvolvimento corporal. No entanto, posteriormente, pesquisadores indicaram que os microrganismos ruminais se adaptam aos ionóforos e limitam sua eficiência em reduzir a produção de metano. Por exemplo, Guan et al. (2006) mostraram que o efeito da redução da emissão de metano foi decrescido três semanas após a adição de monensina ou lasalocida à dieta, embora a redução da relação acetato:propionato persistisse ao longo do período de alimentação de 15 semanas.


Ionóforos, à exemplo da monensina, aprovados para a alimentação de bovinos leiteiros, demonstraram, em geral, aumentar a eficiência da produção de leite. McGuffey et al. (2001) indicaram que a monensina foi superior em promover aumento na produção de leite, comparada à lasalocida. Duffield et al. (2008) indicaram que, na maior parte dos estudos, o consumo de monensina aumentou 2,3% a produção de leite e reduziu, em mesma porcentagem, o CMS. Quando o ganho de peso corporal foi contabilizado, a dieta com monensina resultou em aumento de 4,3% da eficiência energética. Embora as emissões de metano não possam ser calculadas a partir desses dados, a maior eficiência energética acompanhou o CMS mais baixo, o que significa que a intensidade de metano foi reduzida pela suplementação com monensina.


A alimentação com gorduras e ácidos graxos é conhecida por causar redução nas emissões de metano: em parte, devido à toxicidade aos protozoários nos quais reside a maioria dos microrganismos metanogênicos do rúmen (Jayasundara et al. 2016); em parte, pelo revestimento físico da FDN, que reduz a digestibilidade da fibra (NASEM, 2021). O desvio do hidrogênio, da formação de metano para a redução de ácidos graxos insaturados, também é responsável por pequena quantidade dos efeitos provenientes da alimentação com gordura. A equação do NASEM (2021) desenvolvida para estimar a emissão de metano indica que, em dieta típica, o aumento da concentração dos ácidos graxos em 4 a 5% do CMS reduz o metano em cerca de 7%.


Certos ácidos graxos de cadeia média podem ter efeitos substanciais nas emissões de metano. Machmuller et al. (2001) observaram que alimentar ovelhas com dieta que contém 60g/kg MS de óleo de coco reduziu a produção de metano dois dias após a inclusão da dieta. Odongo et al. (2007) relataram que a adição de 50g/kg de ácido mirístico (ácido graxo saturado C-14) reduziu tanto o CMS quanto a produção de leite em cerca de 1 kg/d. No entanto, a emissão de metano foi 36% reduzida e as intensidades de metano por produção de leite e proteína do leite foram 29% e 30% reduzidas, respectivamente. Eugene et al. (2021) mostraram efeito menor da suplementação com gordura na emissão de metano: em média, o CMS reduziu 6,4%, mas a produção de leite permaneceu inalterada, de modo que a intensidade de metano caiu cerca de 9%.


Pesquisas iniciais sobre potenciais inibidores de metano indicaram que, assim como aconteceu com os ionóforos, os microrganismos ruminais se adaptaram rapidamente e as reduções iniciais na emissão de metano se dissiparam em curto período (Clapperton, 1977). No entanto, em pesquisas recentes, foi identificado um composto supressor do metano, que é sintetizado quimicamente: o 3-nitrooxilpropanol (3- NOP), ao qual a adaptação microbiana ainda não ocorreu.


Hristov et al. (2015) observaram que as emissões de metano foram deprimidas por doze semanas, quando o 3-NOP foi fornecido em 40, 60 ou 80 mg/kg MS. As emissões de hidrogênio foram elevadas nas primeiras oito semanas, de acordo com os níveis de inclusão de 3-NOP (ou seja, 80 > 60 > 40), mas, ao final das doze semanas, os tratamentos apresentaram a mesma emissão de hidrogênio. Ainda mais importante, o CMS e os rendimentos em produção de leite, gordura e proteína do leite não foram alterados e a intensidade de metano foi suprimida, em média, em 28%, nos animais que receberam as três inclusões dietéticas de 3-NOP (Tabela 3). Ao contrário dos resultados de Hristov et al. (2015), Jayanegara et al. (2018) relataram declínio linear nas emissões de metano, à medida que as concentrações de 3-NOP foram incrementadas na dieta, conforme posteriormente confirmado por Melgar et al. (2020) e Yu et al. (2021). Ademais, Yu et al. (2021) relataram que o 3-NOP fornece mais efeitos positivos em bovinos leiteiros, comparados aos de corte. Atualmente, não há incentivos financeiros para desenvolver pesquisas sobre a inclusão de 3-NOP ou outros compostos que reduzam a formação de metano.



EM PESQUISAS RECENTES, FOI IDENTIFICADO UM COMPOSTO SINTETIZADO QUIMICAMENTE QUE EXERCE AÇÃO SUPRESSORA SOBRE O METANO


Existe interesse em certas algas vermelhas que suprimiram substancialmente as emissões de metano, quando adicionadas às dietas de ruminantes. Kebreab (2021) relatou que os compostos do tipo bromofórmio encontrados nas espécies de algas Asparagopsis foram os responsáveis por reduzir a formação de metano in vitro. Em ensaio in vivo, no qual algas Asparagopsis foram incluídas na proporção de 1% da MS da dieta de bovinos leiteiros, houve supressão de 67% da emissão de metano. O autor ainda citou trabalhos nos quais demonstraram não haver adaptação microbiana às algas marinhas fornecidas por cinco meses a novilhos. Em relatório que resumiu os resultados da supressão de metano por Asparagopsis, foi descrita a preocupação com a toxicidade potencial do bromofórmio e de outros compostos encontrados em algas marinhas, embora as concentrações necessárias para suprimir a formação de metano pareçam ser bastante baixas (Vijn et al., 2020). Porém, ainda há muita pesquisa a ser feita antes que essa abordagem possa ser incorporada nas fazendas leiteiraa.


Variações individuais


Produtores divergem sobre a raça leiteira mais eficiente em produção e geração de lucro. Capper e Cady (2012) avaliaram os impactos ambientais acarretados pela produção de leite por vacas Holandês e Jersey, para a fabricação de queijo. Eles estimaram que a produção de 500.000 toneladas de queijo exigiria 4,94 bilhões kg de leite de vacas Holandês e 3,99 bilhões de kg de leite de vacas Jersey. Assim, a pegada de carbono para produzir 500.000 toneladas de queijo a partir do leite das Jersey seria reduzida em 1,67 milhões de kg de CO2 eq.


Por outro lado, Olijhoek et al. (2018) avaliaram vacas Jersey e Holandês alimentadas com dietas de baixo e alto concentrado, e observaram que a emissão de metano por CMS foi menor pelas vacas Holandês em ambas as dietas (com diferença mais pronunciada no tratamento com alto concentrado). Além disso, a intensidade de metano por unidade de LCE não diferiu entre as raças.


Prendiville et al. (2009) compararam a eficiência produtiva a pasto, com limitada suplementação concentrada, entre Holandês, Jersey e F1 Holandês x Jersey. Embora as vacas F1 fossem 50 kg mais leves, seu CMS médio foi semelhantes ao das Holandês e maior que o das Jersey, enquanto a produção de leite foi maior pelas Holandês. Ao final, as vacas F1 foram mais eficientes em termos de rendimento do produto e menores prejuízos ao ambiente. Conforme resumido por Berry e Evans (2022), “quanto maior a vaca, mais ela come” – e maior o desafio para reduzir a contribuição da pecuária leiteira na emissão de GEE, pois é preciso diluir os efeitos relacionados ao tamanho corporal e às necessidades metabólicas, sem perder em produção de leite e seus componentes.


O conceito de consumo alimentar residual (CAR), uma métrica de eficiência alimentar inicialmente desenvolvida para avaliar bovinos de corte (Koch et al., 1963), foi incorporada na bovinocultura de leite. O valor de CAR é calculado como a diferença entre o consumo observado e o consumo previsto (com base em modelos de alimentação) de determinado indivíduo, em determinada fase da lactação. Por representar a diferença entre o consumo real e o previsto, valores de CAR menores ou negativos são ideais. As estimativas podem ser feitas retrospectivamente, por meio de dados (acurados e robustos) de estudos nutricionais anteriores (por exemplo, Liu e Vandehaar, 2020). A variação encontrada entre animais indica que o CAR pode ser parâmetro de seleção genética, uma vez que há evidências de ter herdabilidade “moderada” (Connor et al., 2015). Usando dados de 166 vacas entre 50 e 130 dias em lactação, Liu e Vandehaar (2020) determinaram que os melhores (ou seja, menores) valores de CAR de energia estavam bem correlacionados aos melhores (ou seja, menores) valores de CAR de proteína: ao consumirem dietas diferentes apenas no nível de PB, as vacas de cada grupo foram classificadas em alto, médio e baixo CAR. À medida que o CAR diminuiu (ou melhorou), indicando maior eficiência energética, a eficiência na produção de proteína do leite (proteína do leite/consumo PB) e a intensidade de metano melhoraram, em ambos os níveis de PB da dieta (Tabela 4).



A produção de metano/proteína do leite foi menor quando consumida a dieta com 18% PB, o que indica melhor aproveitamento proteico nessa dieta. Essa percepção sugere que a oferta de proteína metabolizável foi insuficiente na dieta com 14% PB. Por fim, os resultados apontam que a seleção para CAR em bovinos leiteiros é uma promessa considerável em favor da sustentabilidade ambiental e econômica dos sistemas de produção de leite.


O CONSUMO ALIMENTAR RESIDUAL (CAR) É UMA MÉTRICA COM POTENCIAL PARA SELECIONAR OS ANIMAIS MAIS EFICIENTES EM CONVERTER ENERGIA E NUTRIENTES CONSUMIDOS EM LEITE DE ALTO VALOR AGREGADO PRODUZIDO


Ferramentas adicionais


Além das abordagens anteriores, ferramentas paralelas despontam para reduzir a intensidade de metano e emissão de GEE. Os aditivos alimentares incluem enzimas fibrolíticas (Arriola et al., 2017), culturas de leveduras (Poppy et al., 2012) e microrganismos de alimentação direta (McAllister, 2011). De forma similar, a incorporação de “óleos essenciais” na dieta demonstra potencial para suprimir as emissões de metano (Belanche et al., 2021; Klop et al., 2017), bem como as misturas alimentares de taninos e óleos essenciais (Rodrigues et al., 2019). Como exemplo, a substituição de leguminosas forrageiras convencionais por leguminosas contendo taninos condensados pode melhorar a eficiência alimentar e proteica (Hymes Fecht et al., 2013) e, possivelmente, reduzir a intensidade de metano na produção de leite (Kelln et al., 2021). Por meio de resumos de pesquisas publicadas, autores apontaram melhora na eficiência alimentar e redução da emissão de GEE em vacas que receberam dosagem quinzenal de somatotropina bovina (Capper et al., 2008; Capper e Bauman, 2013).


Em média, as vacas leiteiras dos EUA têm apenas 2,5 lactações, e cerca de 28% da emissão de GEE é atribuída às novilhas (Capper e Cady, 2020). Logo, qualquer medida capaz de aumentar o número de lactações por vaca contribuirá com a supressão da pegada de carbono associada à atividade leiteira. Algumas das estratégias dietéticas adotadas para melhorar a eficiência da lactação, como a suplementação com ionóforos, também são capazes de melhorar a eficiência de crescimento em novilhas, de forma a reduzir a produção de GEE.


Ainda que não mencionado, o armazenamento de dejetos que são posteriormente utilizados na agricultura também deve ser debatido na proposta de reduzir a pegada de carbono. Nesse contexto, o balanceamento das dietas e o uso de outros métodos que melhoram a eficiência alimentar podem reduzir a produção de dejetos sólidos e líquidos - sobre isso, Benchaar e Hassanat (2019) descreveram manejos interessantes.


A hora da virada


O aquecimento global causado pelo acúmulo de GEE na atmosfera é um dos problemas mais ameaçadores enfrentados pela humanidade, hoje e nas próximas décadas. O metano entérico produzido pelos ruminantes domésticos, inclusive os bovinos leiteiros, é uma das fontes de GEE provenientes das atividades agropecuárias. Cientes disso, reconhecemos que qualquer prática nutricional ou de manejo que aumente a eficiência produtiva da vaca reduzirá a pegada de GEE associada à produção leiteira.


Desde o século passado, muitos progressos foram feitos com relação à produtividade das vacas em lactação em todo o mundo. O Brasil avançou na produção de leite e sólidos por animal, mas ainda há muito a ser feito. A contínua evolução genética do gado leiteiro aumentou a necessidade de adotar modelos nutricionais que atendam, com propriedade e precisão, os requerimentos por energia e proteína metabolizável demandados pelas fêmeas lactantes. O balanceamento acurado das dietas para lactação potencializa a produtividade a partir da redução da intensidade de metano.


Além disso, o metano deriva mais da fermentação da FDN do que do amido no rúmen. Portanto, a suplementação com alimentos ricos em amido e as estratégias para melhorar a qualidade da forrageira incluída na dieta reduzirão a formação do metano. Ainda, a inclusão de gorduras e aditivos químicos, como o 3-NOP, revelam potencial para suprimir diretamente a síntese de metano.


Por fim, o melhoramento genético do futuro poderá ser guiado pela seleção em eficiência do uso de nutrientes, conforme já sinalizado pela métrica que classifica o CAR dos indivíduos.


A roleta do futuro está girando. A cada rodada, é renovada a chance de acertar a estratégia e ser contemplado com o grande prêmio da sustentabilidade da atividade. O momento pede transformação e a hora da virada tem que ser agora.


REFERÊNCIAS


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