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Califórnia reduz 5 milhões de toneladas de metano: o que falta para o leite brasileiro dar esse salto?

Com poucos dados e falta de incentivos direcionados ao leite, o Brasil ainda subaproveita o potencial de tecnologias como biodigestores para transformar a sustentabilidade em vantagem competitiva


A Califórnia, maior produtora de leite dos Estados Unidos, acaba de anunciar um marco histórico: a redução anual de 5 milhões de toneladas métricas de metano em suas fazendas leiteiras. A notícia, publicada pela PR Newswire em 20 de maio de 2025, destaca a força de uma estratégia baseada em incentivos financeiros, políticas públicas claras e parcerias estruturadas com produtores.


Califórnia

À frente desse movimento está a Dairy Cares, uma coalizão que reúne cooperativas, processadoras e organizações do setor leiteiro californiano, que atua de forma coordenada com o governo estadual para garantir o sucesso das metas climáticas. A organização desempenha um papel fundamental na implementação técnica, comunicação de resultados e articulação entre os diferentes agentes da cadeia.


Enquanto o Brasil, que é o quinto maior produtor mundial de leite, ainda carece de dados, visibilidade e estrutura para escalar soluções sustentáveis, o caso californiano mostra que é possível transformar metas ambientais em alavancas de desenvolvimento rural, competitividade e reputação internacional.


1. Como a Califórnia chegou lá


Em 2016, a Califórnia estabeleceu por lei (SB 1383) a meta de reduzir em 40% as emissões de metano de origem pecuária até 2030, com base nos níveis de 2013. Em 2025, o estado já alcançou dois terços dessa meta, um feito apoiado em três pilares:

  • Digestores anaeróbicos: 168 unidades operacionais e cerca de 75 em desenvolvimento, transformando esterco em biogás ou eletricidade.

  • Manejo alternativo de esterco: mais de 120 projetos que mitigam a emissão de metano por meio de práticas como raspagem, compostagem e separação de sólidos.

  • Eficiência produtiva: aumento da produção de leite com redução do número de vacas, reduzindo emissões por litro por meio de investimentos em genética, nutrição e bem-estar.


Além disso, programas como o Dairy Digester Research and Development Program (DDRDP) e o Alternative Manure Management Program (AMMP), geridos pelo Departamento de Agricultura da Califórnia (CDFA), estruturam o financiamento de projetos. A Dairy Cares atua como ponte entre esses programas e os produtores, garantindo adesão e aplicação eficaz dos recursos.


2. O cenário brasileiro: oportunidades e invisibilidades


O Brasil tem um dos maiores rebanhos bovinos do mundo e um setor leiteiro cada vez mais atento à sustentabilidade. Tecnologias como biodigestores (que transformam dejeto em energia renovável) já são realidade em algumas regiões. No entanto, não há um levantamento público que quantifique quantos biodigestores estão operando em fazendas leiteiras no país.


Essa ausência de dados específicos fragiliza a governança climática do setor e dificulta a criação de políticas voltadas à realidade da produção leiteira brasileira. Sabemos que há bons exemplos em andamento, seja com foco em produção de energia, ou redução do uso de fertilizantes inorgânicos. Mas sem visibilidade, não há escala. Sem escala, não há política.


Enquanto isso, modelos como o da Califórnia mostram que o leite pode ser agente climático e energético. Falta dar esse salto institucional por aqui.


3. Eficiência produtiva como ferramenta de mitigação


A experiência californiana também destaca um ponto fundamental: melhorar a eficiência é, em si, uma estratégia climática. No Brasil, isso já acontece, e precisa ser reconhecido. A produção de leite por vaca tem aumentado, enquanto o número de animais se estabiliza ou até diminui em algumas regiões. Esse movimento, quando bem avaliado, mostra a redução que vem ocorrendo na intensidade de emissões de GHG na produção de leite.


Ferramentas como o PEC Calc, que calcula a pegada de carbono da produção de leite, e o BEA Score, que avalia o bem-estar animal, ajudam a medir e comunicar esses avanços. Criadas pela ESGpec, essas soluções democratizam o acesso à sustentabilidade, mesmo sem políticas específicas para isso.


4. O que falta para o salto acontecer


A lição californiana deixa um recado claro: reduzir emissões exige coordenação, recursos e mensuração. Para avançar, o Brasil precisa:

  • Criar linhas de fomento voltadas ao leite baixo carbono, com foco em biodigestores e manejo de dejetos.

  • Medir e divulgar publicamente o uso de biodigestores na cadeia do leite.

  • Reforçar a atuação de coalizões multissetoriais, nos moldes da Dairy Cares, para acelerar a agenda ESG no setor.

  • Ampliar o acesso a ferramentas de diagnóstico técnico e financeiro para produtores de todos os perfis.


Enquanto seguimos acompanhando exemplos de fora, é urgente criar nossos próprios mecanismos de estímulo, monitoramento e valorização.


5. Conclusão: dados, governança e reconhecimento


Reduzir a emissão de metano é mais do que cumprir uma meta climática: é reposicionar o leite brasileiro na agenda ambiental global. O caso da Califórnia, liderado por coalizões como a Dairy Cares e sustentado por programas públicos bem estruturados, mostra que é possível combinar sustentabilidade, eficiência e reputação de marca.


O Brasil tem clima, ciência, produtores e vontade. Falta transformar tudo isso em política, estrutura e comunicação. O salto não é só técnico, é institucional.


🟢 O leite pode sim ser uma das soluções para o futuro regenerativo da agropecuária.


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